Análise crítica: Barroso, o discurso da neutralidade e os ecos da Inquisição
- Luana Valente

- 1 de set.
- 2 min de leitura

A recente declaração do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, de que o Brasil está “muito próximo de empurrar o extremismo para a margem da história”, levanta preocupações legítimas sobre o papel do magistrado na preservação da imparcialidade judicial — especialmente às vésperas do julgamento de Jair Bolsonaro e outros réus acusados de tentativa de golpe de Estado.
Embora Barroso não participe diretamente do julgamento, sua fala pública pode ser interpretada como uma antecipação de juízo. Ao associar o processo judicial à superação do extremismo, o ministro parece alinhar o resultado esperado com uma narrativa política, o que compromete a separação entre o discurso institucional e a função judicante. A Constituição brasileira exige que os magistrados se abstenham de manifestações que possam comprometer a imparcialidade ou sugerir pré-julgamento — ainda mais quando se trata de um caso de tamanha relevância histórica e política.
O paralelo com a Inquisição
A comparação com a Inquisição não é meramente retórica. Naquele período, o poder religioso e jurídico se fundiam para perseguir dissidentes sob o pretexto de preservar a ordem e a fé. A sentença já estava implícita no ato de acusar, e o processo era muitas vezes uma formalidade para legitimar a punição previamente decidida.
Barroso, ao declarar que o país está prestes a marginalizar o extremismo, corre o risco de repetir esse padrão simbólico: transformar o julgamento em um rito de político, onde o veredito parece já estar dado. A retórica de “encerrar ciclos de atraso”, embora sedutora para quem deseja estabilidade institucional, pode ser perigosa se usada para justificar a eliminação de vozes dissonantes sob o rótulo genérico de “extremismo”.
O dilema da toga ativista
O ministro tem sido elogiado por sua atuação em pautas progressistas e por defender a democracia diante de ameaças reais. No entanto, há uma linha tênue entre proteger a institucionalidade e assumir uma postura de protagonismo político. Quando o guardião da Constituição se torna também seu intérprete moral, o risco é que o Judiciário deixe de ser um árbitro e passe a ser um ator — com poder de definir quem pertence ou não ao jogo democrático.
A democracia não se fortalece com silenciamentos, mas com o enfrentamento plural de ideias, inclusive aquelas que incomodam. O extremismo, quando real e violento, deve ser combatido com firmeza. Mas quando o conceito é usado de forma vaga, pode servir como instrumento de exclusão política — e aí, o Judiciário deixa de ser um bastião da liberdade para se tornar um tribunal de doutrina.






Comentários